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Cuidar Melhor é Urgente: A Realidade dos Lares e o Desafio da Demência em Portugal

 


A recente reportagem que analisa a realidade dos lares em Portugal expõe dados que não podem ser ignorados: 75% dos idosos com demência não saem à rua, mais de metade apresenta défice cognitivo e 28% nunca recebem visitas dos próprios filhos. São números que, mais do que estatísticas, representam vidas isoladas, rotinas empobrecidas e um sistema que luta para dar resposta às necessidades crescentes da população envelhecida.

A demência, ao contrário de muitas outras condições, exige cuidados específicos, presença humana, estimulação cognitiva, segurança e, acima de tudo, uma abordagem centrada na pessoa. Quando estes requisitos falham, as consequências são profundas: regressão funcional acelerada, maior agitação, perda de autonomia e deterioração emocional.

Um retrato que exige ação imediata

A reportagem revela uma realidade que muitos profissionais e familiares já conhecem bem:

  • Muitos idosos passam dias inteiros sentados, sem atividades estruturadas.

  • A estimulação cognitiva, emocional e social é muitas vezes insuficiente.

  • A saída ao exterior essencial para a saúde física e mental  é rara ou inexistente.

  • A escassez de funcionários limita a capacidade de resposta.

  • A formação específica em demência é ainda insuficiente na maioria das instituições.

Este cenário mostra claramente que não estamos apenas perante um problema de recursos, mas de modelo de cuidados. O envelhecimento da população continuará a aumentar, e por isso precisamos urgentemente de reorganizar a forma como cuidamos.

O que precisa de mudar?

Respostas e soluções necessárias

1. Rever a política de cuidados de longa duração

É urgente construir um modelo atualizado, moderno e centrado nas necessidades reais das pessoas com demência. Isso implica:

  • Reforço do investimento público e privado em estruturas residenciais.

  • Maior fiscalização da qualidade dos serviços prestados.

  • Criação de normas mínimas obrigatórias de estimulação, atividades e interação social.

  • Incentivos à criação de respostas alternativas: Centros de Dia, equipas domiciliárias, serviços integrados.

2. Formação específica e contínua para os profissionais

Os cuidadores, assistentes operacionais, auxiliares e técnicos de saúde precisam de:

  • Formação em comunicação com pessoas com demência.

  • Técnicas de estimulação cognitiva e funcional.

  • Estratégias de prevenção de comportamentos desafiantes.

  • Ferramentas de autocuidado (burnout entre cuidadores formais é muito elevado).

  • Supervisão técnica regular.

Sem profissionais capacitados, os melhores planos ficam no papel.

3. Reforço das equipas nos lares

A falta de pessoal é uma das causas centrais do problema. Medidas possíveis incluem:

  • Criação de rácios mínimos obrigatórios entre profissionais e residentes.

  • Valorização salarial e progressão na carreira.

  • Benefícios fiscais para instituições que cumpram boas práticas.

  • Equipas multidisciplinares com psicólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas.

4. Programas diários de estimulação e atividades significativas

Atividades estruturadas devem ser a regra, não a exceção. Exemplos:

  • Caminhadas orientadas e saídas ao exterior.

  • Oficinas de memória e estimulação cognitiva.

  • Atividades musicais, artísticas e culinárias.

  • Rotinas que promovam autonomia (vestir-se, arrumar objetos, jardinar).

  • Sessões de movimento adaptado.

Mesmo pequenos estímulos fazem enorme diferença na qualidade de vida.

5. Apoio às famílias

Muitos familiares não visitam por dificuldade, distância ou exaustão emocional.

 É fundamental:

  • Criar programas de apoio psicológico aos cuidadores informais.

  • Formações e workshops sobre demência.

  • Melhor comunicação entre lares e famílias.

  • Incentivos a visitas regulares, incluindo horários mais flexíveis.

Quando a família está envolvida, o idoso sente-se mais seguro e emocionalmente protegido.

6. Tornar a comunidade parte da solução

A sociedade deve ser mais inclusiva para as pessoas com demência. 

Estratégias:

  • Parcerias entre lares e escolas, associações e grupos culturais.

  • Projetos intergeracionais.

  • “Cidades amigas da demência”, com espaços públicos acessíveis e atividades comunitárias.

A demência não deve ser sinónimo de isolamento.

Conclusão: Cuidar não é apenas tratar é valorizar vidas

Os números mostram que não basta garantir camas: é preciso garantir vida, significado, atividade, relações humanas e bem-estar. Cada idoso com demência tem uma história, memórias, afetos e necessidades que merecem atenção e respeito.

Rever as políticas de cuidados, investir na formação técnica e promover ambientes de cuidado mais humanos não é apenas uma medida administrativa é um dever ético e social.

A urgência é real. A resposta tem de ser coletiva. E o momento de agir é agora.

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